Valor Econômico: Arcabouço coloca limite de 70% para despesas
Em: 30 Março 2023 | Fonte: Valor Econômico
Proposta apresentada por Haddad estabelece metas para superávit primário de até 1% em 2026
O novo arcabouço fiscal vai estabelecer que as despesas estarão limitadas a 70% das receitas, revelou fonte do governo ao Valor. Essa regra de gastos virá combinada com previsões de resultado primário das contas públicas, que deverão ser fixadas em zero para 2024, 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) para 2025 e 1% do PIB para 2026.
Haverá mecanismos de ajuste caso os objetivos não sejam alcançados, informou. Esse era um ponto de atenção dos especialistas em contas públicas.
A nova regra recebeu nessa quarta-feira (29) o sinal verde do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), informou o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha. Ele disse que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foi orientado a apresentar o conteúdo a deputados e senadores. O ministro ficou de discutir as regras com os parlamentares até a manhã de quinta-feira e depois apresentá-las à imprensa. O conteúdo das conversas com os políticos será levado a Lula e a proposta deve ser formalizada ao Congresso, na forma de um projeto de lei complementar, até a sexta-feira de Páscoa.
Ontem mesmo Haddad reuniu-se com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e líderes da base aliada ao governo - no encontro, no entanto, foram apresentados tópicos apenas.
Segundo o deputado Mauro Benevides Filho (PDT-CE), que esteve no encontro com Lira e Haddad, a regra fiscal apresentada pelo ministro da Fazenda estabelece que as despesas do governo só poderão aumentar em valor equivalente a 70% do crescimento das receitas, mas esse percentual será reduzido como punição, caso o governo não cumpra a meta de resultado fiscal estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Se a meta for descumprida, o governo só poderá aumentar suas despesas em 50% da receita no ano seguinte. Se descumprir de novo, cairia para 30% no ano posterior. De acordo com Benevides, não haveria punições adicionais ao governo se a meta não for cumprida. Benevides disse ainda que a nova regra fiscal será permanente.
Como se trata de uma lei complementar, sem capacidade de mudar a Constituição, os gastos com saúde e educação são vinculados à receita corrente líquida e terão crescimento de 100% do incremento da arrecadação. “Por isso, as demais despesas terão que crescer menos de 70% para compensar”, explicou.
Vice-líder do governo na Câmara, o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) afirmou que viu pontos positivos, como estabelecer regra para o crescimento das despesas, e outros preocupantes. “Não ficou claro como será o tratamento das receitas extraordinárias. O acordo do Carf, por exemplo, é uma receita que só entra uma vez e depois não se repete. Vai servir como ancoragem da despesa?”, questionou. Ele também opinou que o governo deveria propor uma meta de endividamento.
Para Padilha, a regra “aliará responsabilidade fiscal com responsabilidade social” e terá metas de controle de despesas e de superávit e regras anticíclicas, para momentos de crise econômica, destacou. O ministro acrescentou ainda que a expectativa é de aprovação do projeto de lei pelo Congresso “o mais rápido possível”, porque as novas regras têm impacto no texto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024 e também nas decisões de investimentos e da taxa de juros do país. Ele lembrou que Lira já falou em votar o projeto em duas semanas, dada a importância do tema.
O relator do projeto na Câmara, segundo Padilha, seria discutido também na reunião de Haddad com os deputados. O governo pede que seja um relator que “tenha capacidade de diálogo com todos, qualidade para fazer esse debate e compromisso com responsabilidade social e fiscal”. A decisão sobre quem será escolhido é do presidente da Câmara. “A partir de agora, o debate é no Congresso e na sociedade”, disse Padilha.
A Emenda Constitucional 126, que tramitou como Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, estabelece que o teto de gastos será substituído por uma nova regra para as contas públicas, a ser proposta ao Congresso Nacional até o dia 31 de agosto. Haddad decidiu encurtar o cronograma por causa do projeto da LDO e também pela expectativa do governo que a nova regra abra caminho para a queda da taxa de juros.
A ideia era apresentar a proposta já na semana passada, mas Lula pediu que fossem refeitos alguns cálculos para as áreas de saúde e educação. Atualmente, os gastos mínimos previstos na Constituição para essas duas áreas estão suspensos por causa da regra do teto de gastos. Como, porém, o teto será revogado, as vinculações constitucionais voltarão a a valer.
Em fevereiro, o Valor publicou entrevista em que o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, informou que o arcabouço traria despesas crescendo a um ritmo menor do que o das receitas. Ele comentou que essa situação teria de ser mantida por algum tempo, para reduzir a trajetória da dívida pública.