O Globo: Estudo mostra que 27% dos jovens e adolescentes no Brasil estão sem estudo e sem trabalho
Em: 15 Março 2023 | Fonte: O Globo
O mesmo levantamento ainda sugere que cursos profissionalizantes estejam mais alinhados com as vagas em ascensão no presente, como a área de tecnologia
Quase um a cada três jovens no Brasil (27%), com idades entre 14 e 29 anos, não têm oportunidade de estudo nem de trabalho. É o que mostra um levantamento “Futuro do mundo do trabalho para juventudes brasileiras”, que será lançado nesta quinta-feira no Canal Futura, via YouTube. A mesma pesquisa mostra que 39% desses meninos e meninas somente trabalha, enquanto outros 15% somente estudam, mais 14% estudam e têm empregos. Por fim, 5% estudam, mas são desempregados.
Especialistas apontam que esses dados são especialmente alarmantes quando se olha o outro lado da mesa — ou seja, o que pensam as empresas contratantes. Um levantamento com 34 organizações (presentes no mesmo relatório) mostra que é preciso ajustar a sintonia entre os cursos de formação e as vagas efetivamente disponíveis. Essas entidades participantes do questionário, vale dizer, trabalham diretamente ou indiretamente na inclusão produtiva de jovens brasileiros.
Do total, 67,6% afirmam que faltam cursos de qualificação profissional e formação técnica adequados para os diferentes perfis de jovens que vivem no Brasil. Mais da metade das empresas (58,8%) dizem que as classes profissionalizantes não estão atualizadas ou em sintonia com o que espera o mercado. Um grupo mais volumoso ainda vai além e diz que 82,3% não conseguem contratar jovens com as qualificações que necessitam para as posições de emprego disponíveis.
— A tendência não é positiva. Veremos o crescimento do grupo de jovens sem trabalho e sem estudo nos próximos anos. As empresas terão que fazer uma força reversa (apostar e capacitar os mais jovens) para mudar esse cenário — Eduardo Georjão Fernandes, diretor do Instituto Cíclica, responsável pelo levantamento ao lado do Instituto Veredas. — Os mais jovens estão localizados em postos de trabalhos precarizados, o que é um grande problema.
O relatório foi realizado com análise de mais de 500 publicações que tocam no tema juventude e trabalho somados ao encaminhamento de questionários a 34 empresas. O dossiê é um conjunto da Fundação Roberto Marinho (FRM) em associação com o Itaú Educação e Trabalho e mais as fundações Arymax, Telefônica Vivo e Goyn SP.
Uma das maneiras de remediar o amplo volume dos jovens sem emprego, observa Rosalina Soares, assessora de pesquisa e avaliação da FRM, é justamente fortalecer as relações de aprendizagem no país.
— A aprendizagem baseada no trabalho é uma das possibilidades para profissionalizar esses jovens. Temos uma lei que determina que as empresas de grande porte precisam determinar de 5% a 15% das vagas para jovens de 14 e 24 anos, mas o país está muito atrasado em relação a essa agenda. Quando olhamos para esse potencial da cota, vemos que ainda é necessário dobrar o volume de aprendizes para chegar ao mínimo estipulado — afirma Rosalina. — Temos cerca de 500 mil aprendizes e podemos chegar a 1 milhão de adolescentes e jovens, caso essa cota seja respeitada.
Carreiras do futuro
De olho nas ponderações das empresas contratantes, as organizações responsáveis pelo relatório sugerem que as posições de trabalho — e as classes de profissionalização — sigam uma agenda que mire nas áreas de tecnologia, preservação do meio-ambiente, cuidados, cultura e criatividade e nas áreas de consumo que estejam relacionadas ao público de 50 anos ou mais, a chamada "economia prateada".
— É preciso pensar em certificar esses jovens ao longo do caminho, sem precisar que eles passem por um curso longo, de cinco anos, por exemplo. As vagas de entrada nas empresas, sobretudo se tratando de tecnologia, já pedem essas habilidades. É uma realidade. A conversa sobre trabalho deve ser iniciada desde a educação básica — afirma Lia Glaz, diretora presidente da Fundação Telefônica Vivo.
Outro fator importante que pode virar o jogo à favor dos jovens e adolescentes é o foco no desenvolvimento socioemocional: habilidade que deve ser perseguida a todo custo nos cursos profissionalizante e até nas salas de aula regulares. Rosalina Soares lembra que, em 2022, a fundação realizou uma escuta com gestores de recursos humanos que contratam jovens em nível médio e técnico. Recebeu como devolutiva a informação de que o comprometimento e boa desenvoltura figuram como 72% das características pessoais que interessam a uma empresa no momento da contratação. Conhecimento ou experiência na função (52% das respostas) também são aspectos que enchem os olhos dos recrutadores.
— Essas habilidades também aparecem critérios fundamentais quando uma empresa decide desligar esse jovem da empresa. As habilidades socioemocionais estão absolutamente relacionadas às carreiras do emergentes e no mundo agora — diz.
É esse fator, inclusive, que a estudante Anna Clara de Souza Freitas, de 17 anos, moradora do Rio, vê sua maior evolução ao longo do período de pouco mais de um ano que passou como aprendiz em uma empresa de processamento de pagamentos. Agora, prepara-se para iniciar sua segunda oportunidade em uma empresa de entretenimento. Ela faz parte do programa Aprendiz Legal, uma iniciativa da FRM em parceria do Centro Integrado de Estudos e Programas de Desenvolvimento Sustentável (Cieds) nos estados do Rio e São Paulo.
— Adquiri muito autoconhecimento. Hoje em dia consigo me posicionar, me comportar corretamente. Mesmo que não siga a área administrativa, onde trabalhei, vejo que essa experiência vai me ajudar. Meu sonho é ser enfermeira.